sábado, 14 de maio de 2011

Patagônia Run - Relato da prova

A Patagônia Run é uma corrida de montanha realizada na cidade de San Martin de Los Andes, província de Neuquén, Argentina. A prova é disputada nas distâncias de 10, 21, 42 e 84 km. A segunda edição da prova aconteceu no dia 16 de abril de 2011 onde reuniu mais de 1200 corredores nas quatro distâncias vindos de diversas partes da Argentina e de outros países como Brasil, Chile, Colômbia, Estados Unidos, Uruguai, Bélgica, entre outros.


Cidade de San Martin de Los Andes.

A distância principal da competição são os 84 km (dupla maratona) disputados em terreno bastante técnico com subidas e descidas íngremes onde os atletas percorrem diferentes tipos de terrenos (pastos, trilhas estreitas, floresta, neve, riachos, pedras, etc.) com um desnível acumulado de 3590 metros aproximadamente.

No total a prova tinha nove postos de controle onde seriam fornecidas bebidas, comida, assistência médica e guarda roupa para os atletas que optarem por enviar sacolas no dia anterior a largada contendo alguns equipamentos adicionais para serem utilizados durante a prova.

     Percurso da prova.


Altimetria da prova.

 Cheguei em San Martin de Los Andes na quarta-feira a tarde e a cidade já estava no clima da corrida. As pessoas da cidade se envolvem muito com os eventos esportivos e são muito receptivas querendo conversar, perguntando sobre a prova, distância, país de origem, etc.

O clima estava bem frio e ventava bastante fazendo com que a sensação térmica fosse de temperaturas negativas. Em alguns momentos chovia um pouco e segundo as informações locais estava nevando nas montanhas onde seria realizada a competição.

Na quinta e sexta-feira foram os dias para a entrega dos kits e do congresso técnico que foi obrigatório a todos os participantes. A organização fez questão de enfatizar o quanto a prova teria dificuldades técnicas e principalmente com relação ao clima que embora tivesse uma previsão de céu claro e sol, enfrentaríamos nas primeiras horas dos 84 km temperaturas abaixo de zero e bastante vento contra.

A largada da prova seria as 05h30min da manhã partindo das proximidades da cidade de San Martin de Los Andes. A organização disponibilizou carros para levar os atletas até a largada que seria dentro de um quartel militar (Regimiento de Caballaría de Montaña 4). Foi preparado um local aquecido com café da manhã para os atletas onde sairíamos apenas cinco minutos antes da largada para evitar ao máximo o contato com o frio.

No dia da prova saímos cedo em direção ao local de largada onde a organização já nos esperava com um café da manhã. O frio era grande e ficamos o tempo todo dentro de um alojamento aquecido onde os atletas aproveitaram o tempo para se aquecer, conversar e conferir os equipamentos. Faltando pouco menos de cinco minutos para a largada nos dirigimos até o local de partida para a contagem regressiva.

As 05h30min em ponto foi dada a largada e os quase 150 atletas partiram para o grande desafio. Já nos primeiros quilômetros começamos a enfrentar grandes subidas e à medida que avançávamos o frio se tornava maior. Sai em um grupo logo atrás dos líderes visando ganhar um pouco de tempo antes de entrar nos trechos com percurso mais técnico e estreito.


Largada da prova.

Os primeiros quilômetros foram fáceis, pois o corpo estava completamente descansado. Porém era preciso segurar um pouco o ritmo e guardar energia para os trechos finais. Percebi que muitos atletas estavam forçando o ritmo e isso poderia ser um risco caso optasse por seguir com eles. Minha estratégia era correr durante a noite com um pouco mais de cautela visto que a visibilidade era baixa e o risco de errar o caminho ou se machucar com pedras e troncos era grande. Não fiz nenhuma questão de seguir o grupo e optei por correr no meu ritmo dando passagem aos demais. Essas provas são muito longas e as coisas mudam muito ao longo do dia.

O primeiro trecho da prova era duro com desnível bastante elevado e o primeiro posto de hidratação estava a seis quilômetros da largada. Neste momento estava correndo com vários atletas em um grupo de mais ou menos dez pessoas que iam se revezando na frente. Enfrentamos uma grande subida chegando ao mirante Los Bayos com altitude de 1050 metros sobre o nível do mar e depois uma grande descida até a Laguna Rosales onde estava localizado o primeiro posto de hidratação. Passei rapidamente pelo posto, peguei um isotônico e segui em frente rumo ao segundo trecho da prova.

O segundo trecho da prova também apresentava alto grau de dificuldade com uma subida bastante íngreme no Filo Lolog atingindo 1350 metros sobre o nível do mar e em seguida com uma grande descida repleta de gelo e troncos de árvore chegando à Laguna Rosales onde estava o segundo posto de controle. Neste momento o céu estava maravilhoso e o frio castigava bastante o corpo. Aproveitei para comer algo e repor as garrafas de água e isotônico e seguir em frente. Tínhamos acabado de passar pelo km 15 e o pelotão ainda estava bastante compacto e seguia em um ritmo forte.

Segundo trecho da prova – Céu estrelado e belas paisagens.

O terceiro trecho era um pouco mais plano e o percurso era em terreno aberto ao longo de grandes pastos com alguns riachos e árvores pelo caminho. Todos estavam tentando correr um pouco mais rápido para recuperar o tempo perdido nos últimos trechos. O frio me dificultava para imprimir um bom ritmo e continuei seguindo o pelotão que aos poucos começava a se dispersar. Nesse momento o dia começava a amanhecer e o visual era de tirar o fôlego. No km 25 chegamos ao posto de controle Colorado onde havia uma boa infraestrutura com bastante comida, bebidas quentes além de água e isotônico. Procurei comer um pouco mais e trocar as minhas garrafas de hidratação, pois o trecho seguinte era o mais duro da prova.

Terceiro trecho da prova – Início da manhã com muito frio.

O quarto trecho seguia por campos com pastagem e um terreno com muitas árvores e obstáculos como troncos, riachos, cercas, atoleiros, entre outros. Era muito importante manter a concentração e prestar bastante atenção no piso para evitar acidentes. O sol já começava a aparecer e a temperatura subia um pouco. Quando alcançamos o quilômetro trinta se iniciou a subida mais íngreme da prova onde era necessário caminhar. Foram quatro quilômetros muito duros e à medida que subíamos o terreno ficava mais úmido e com presença de neve o que dificultava muito o deslocamento. Tentei imprimir uma caminhada um pouco mais rápido, porém sem sucesso. A neve chegava a 20 cm e o pé além de molhado afundava o tempo todo. Após 4 km de caminhada chegamos ao Cumbre Quilanlahue com altitude de 1513 metros de elevação. Era o ponto mais alto da prova e a partir daí iniciava uma dura descida de aproximadamente 2 km em um terreno de terra com muitos obstáculos e bastante escorregadio. O grupo estava um pouco disperso, porém seguíamos em torno de quatro a cinco corredores. Neste momento percebi que meu corpo estava começando a reagir após longos quilômetros com dificuldade devido às baixas temperaturas. Decidi que era hora de arriscar uma descida um pouco mais forte e quem sabe abrir um pouco de vantagem em relação ao grupo. Comecei a descer e fui aumentando a velocidade. Ultrapassei rapidamente os corredores e segui forte até atingir a base da montanha onde estava localizado o quarto posto de controle situado no km 34 ao longo de um estaleiro repleto de belas pastagens. Fiz a reposição das garrafas e comi alguma coisa e sai o mais rápido possível, pois queria abrir vantagem do grupo que vinha logo atrás e tentar tirar a diferença de alguns adversários que estavam indo à frente.

Quarto trecho – início da subida em direção ao Quilanlahue.

Quarto trecho – chegando ao Quilanlahue.


Quarto trecho – Atingindo o ponto mais alto da prova – 1513 metros de altitude.


Quarto trecho – Início da descida.

O quinto trecho se iniciou ao longo de uma larga estrada com bastante barro onde era possível correr um pouco mais rápido. Neste momento já me sentia bem o suficiente para seguir fazendo força e recuperar algumas posições perdidas durante a noite. Estava bastante eufórico pela melhoria e à medida que seguia me animava mais. Com alguns quilômetros mais tivemos que enfrentar o primeiro rio com água nos joelhos. Não tinha como passar sem ser pela água que estava próximo de zero grau de temperatura. Segui em frente e a sensação até que foi boa para dar uma resfriada nas pernas embora o tênis tenha ficado encharcado. Logo à frente encontrei um corredor que seguia em um bom ritmo. Corremos juntos por alguns quilômetros quando resolvi imprimir um ritmo mais forte e deixá-lo para trás. Neste momento iniciávamos uma grande descida dentro de uma floresta em direção ao Lago Lácar, ponto mais baixo da prova. A trilha estava larga, sem muitos obstáculos e o piso bastante firme o que permitia correr bem rápido e abrir vantagem sobre os demais. Foram aproximadamente quatro quilômetros de descidas dentro da floresta até chegar ao quinto posto de controle em Quechuquina localizado no km 44. Fiz novamente uma parada rápida apenas para trocar as garrafas de hidratação e pegar alguma comida. Não sabia exatamente qual era a minha posição, mas estava me sentindo bem e confiante para seguir fazendo força na busca pelos que iam à frente.


Quinto trecho – Descida pela floresta em direção ao Lago Lácar.

Quinto trecho – Posto de controle Quechuquina, restando 40 km para a chegada.

O sexto trecho se iniciou dentro de uma floresta chegando às margens do Lago Lácar. Era um trecho repleto de pedras e de grande dificuldade técnica gerando bastante desgaste nas pernas. Neste momento atingimos o ponto mais baixo da prova com elevação aproximada de 642 metros sobre o nível do mar. De longe pude avistar um corredor que seguia em ritmo lento pouco a frente. Aumentei um pouco a velocidade e passei por ele assim que terminou o trecho de pedras próximo do lago onde voltávamos para a floresta em direção ao posto de controle que se aproximava. Neste momento estávamos chegando ao km 50 da prova. Como foi um trecho curto e ainda tinha bebida suficiente passei pelo posto sem me reabastecer e segui em direção ao próximo trecho onde iniciaríamos a subida de volta a Quilanlahue.


Sexto trecho – Corrida as margens do Lago Lácar.

O sétimo trecho começou com subidas muito íngremes dentro da floresta. O percurso era bastante técnico com árvores caídas e troncos soltos pelo chão. A atenção era redobrada para não errar o caminho ou mesmo se machucar com algum obstáculo. Corri o tempo todo sozinho e às vezes olhava para trás para ver se outros atletas não estavam vindos. Depois de aproximadamente dez quilômetros estava chegando novamente ao posto de controle Quilanlahue localizado no km 60 da prova e com elevação de 960 metros sobre o nível do mar. Passei por esse posto de controle no km 35 e agora já estava no caminho de volta rumo a cidade de San Martin de Los Andes. Neste momento fui informado de que estava na sétima posição e confesso que fiquei bastante surpreso. Tratei de me alimentar um pouco melhor e reabastecer as garrafas com água e isotônico e segui em frente. Faltavam ainda vinte e cinco quilômetros até a tão sonhada chegada.


Sétimo trecho – Entrando novamente na floresta em direção ao próximo posto de controle.

O oitavo trecho se iniciou com uma corrida por uma estrada de terra e com ótimo piso. Tentei correr o mais rápido possível para abrir vantagem com relação aos que vinham atrás. Estava bastante feliz de estar bem colocado, porém a prova só termina quando se cruza a linha de chegada e ainda tinha aproximadamente 20 km até a chegada. Procurei manter o foco na prova e não pensar em mais nada além de correr. Depois de alguns quilômetros na estrada de terra com percurso variado enfrentei mais algumas subidas técnicas e campos de pastagem. O corpo já dava alguns sinais de cansaço, mas estava bem psicologicamente. Não era possível avistar nenhum atleta a frente devido ao percurso com bastantes obstáculos. No km 69 cheguei ao posto de controle Colorado, o mesmo que tinha passado no km 25 quando o sol ainda estava surgindo entre as montanhas. Comi algo rápido, reabasteci as garrafas e fui informado que faltavam apenas 14 km até a chegada e que os próximos quilômetros seriam em terreno plano e descidas.


Oitavo trecho – Seguindo em direção ao posto de controle Colorado.

O nono trecho começou com uma longa descida com pouca inclinação a beira de uma estrada onde foi possível correr bem e descansar um pouco as pernas que já davam sinais de cansado. A partir deste trecho era comum encontrar corredores que estavam disputando os 42 km, pois o percurso deste ponto em diante era comum para ambas as provas. Ultrapassei muitos atletas, porém todos estavam correndo os 42 km. Depois de alguns quilômetros percebi que seguia a minha frente um atleta que parecia estar correndo os 84 km. Me animei novamente e forcei um pouco o ritmo e com mais alguns quilômetros consegui ultrapassá-lo. Estava agora na sexta posição e faltavam apenas 8 km para a chegada. Sabia que era importante manter o ritmo e não pensar na distância afinal nestes trechos finais qualquer descuido pode comprometer a prova. No km 78 cheguei ao último posto de controle. Estava me sentindo bem e aproveitei para fazer uma parada rápida, pois o atleta que havia ultrapassado poderia estar bem próximo. Neste momento só pensava na chegada. Tentava me concentrar na prova, mas já era difícil.


Nono trecho – Percurso em descida sem muitos obstáculos.

O último trecho da prova eram descidas longas sem muitas inclinações e dificuldades técnicas. Neste momento começou a chover e a temperatura caiu rapidamente. Tirei da mochila a jaqueta “corta-vento” e procurei me agasalhar para o restante da prova. Após alguns quilômetros entrei na cidade de San Martin de Los Andes e depois de muitas horas correndo pelas montanhas da Patagônia Argentina estava na Avenida San Martin a poucos metros de cruzar a linha de chegada. Já conseguia ver o pórtico de chegada, olhei para trás não avistei ninguém e aproveitei os últimos metros para desfrutar destes momentos magníficos que passei e que estavam por acabar. As pessoas da cidade aplaudiam e apoiavam os atletas que estavam chegando. Foi um momento muito especial para mim.

Depois de 10 horas, 14 minutos e 36 segundos cruzei a linha de chegada em sexto lugar geral após percorrer 84 km ao lado de excelentes corredores em meio a belas paisagens na Patagônia Argentina.


Forte abraço a todos e bons treinos!!!!


segunda-feira, 2 de maio de 2011

Patagônia Run - 84 km

Olá Pessol,

Seguem algumas fotos da competição disputada na belíssima cidade de San Martin de Los Andes, Argentina. Em breve estarei divulgando o relato da prova.

Um forte abraço a todos

Léo Freitas